O uso da voz na ampliação da imagem corporal e no desenvolvimento da relação com o cliente
por Bruno Bernardes
Este artigo foi desenvolvido através do trabalho pessoal feito com o autor e as conversas cheias de trocas de informações nas sessões realizadas, tanto de Rolfing quanto de fonoaudiologia com a Fonoaudióloga Roberta Ventura sobre voz, postura e relação.
A voz, assim como a postura, é uma forma com o qual nos relacionamos com o mundo ao nosso redor, a partir do que vemos no nosso mundo interno. Da mesma forma que o corpo, a voz tem sua expressão além do que as palavras comunicam. O tom, o volume, a modulação e várias outras características que a voz permite expressar constroem nossa relação com o mundo externo e também ditam como os outros se relacionam conosco, através da recepção da nossa emissão de sinais sonoros relativos as nossas emoções, intenções e posicionamento corporal.
A postura é a representação da nossa relação do mundo interno com o mundo externo e esta relação acaba interferindo, obviamente, no funcionamento dos sistemas respiratórios e no posicionamento da epiglote, região de onde saem a maioria de sons que emitimos e no posicionamento do articulação temporo mandibular e língua que também colaboram com a execução dos sons e da emissão das palavras.
Tanto na voz, quanto no corpo, temos instrumento e instrumentista: quanto mais perspicaz, experiente e eficiente se torna o instrumentista, melhor se torna o instrumento.
A voz pode ter classificações por suas características: o timbre da voz é como se fosse o tipo de instrumento que temos em nosso aparato vocal: alguns têm violinos, outros violoncelos e assim por diante.
O tom é a nota que utilizamos para tocar aquela musica que queremos comunicar: pode ter um tom mais grave, quando as vezes estamos mais firmes no que queremos dizer ou ligeiramente mais agudos quando queremos trazer delicadeza para nossa comunicação.
Há também a modulação que é como fazemos a junção das notas musicais para construir a melodia que usamos em nossas frases. Por exemplo, se estamos perguntando, fazemos um tipo de melodia, quando estamos impressionados, a melodia da mesma frase se torna completamente diferente mesmo utilizando as mesmas palavras.
Todos estes atributos fazem da nossa voz, alem das palavras, um instrumento afinado de comunicação não verbal extremamente importantes na relação e, quanto mais experientes nos tornamos em calibrar e treinar este sistema, melhor ele se torna para expressar o que realmente desejamos como nossas palavras.
“Dara.” Cigano Igor, 1992.
Voz é movimento, movimento do corpo que se modifica na intenção do que queremos dizer, que se modifica conforme nossas atitudes que muitas vezes não saem nas palavras mas sai na modulação do que queremos esconder, nos múltiplos movimentos que o aparato vocálico realiza e que também tem inibições, assim como o corpo, que também tem restrições e fica presa se repetindo no mesmo tom e acaba se machucando como nos padrões de movimento que geram lesões. Assim como o corpo, a voz deve ter a permissão de caminhar nas mais variadas possibilidades para que nos possa ser permitido escolher, que posição queremos utilizar ou que nos tragam mais conforto e suporte.
O uso corporal e a percepção mudam a voz e vice versa. Quando ampliamos a capacidade corporal em termos de possibilidades e eficiência, a capacidade aparelho vocálico também se modifica. Parece um pouco obvio quando falamos assim, mas perceber as nuances das mudanças causadas por cada sessão de Rolfing (um tema que poderá ser trabalhado em breve), mas principalmente na sétima sessão, momento em que todas as partes do aparato vocálico adjacências são trabalhados e explorados, é uma excelente oportunidade para explorar não apenas a questão do olhar e escutar, que são instrumentos primariamente de percepção do espaço, mas também como a voz, quanto instrumento de ação, pode alcançar o espaço.
A voz também tem sua kinesfera, a forma com que a utilizamos tem ligação com nosso espaço interno e externo, com nossas relações e com a forma com que nos relacionamos. Utilizamos no corpo padrões para nos relacionarmos com diferentes tipos de pessoas, o de nossa linguagem corporal, que permite desenvolver através desta comunicação não verbal o rapport com nossos clientes, e a voz também deve fazer parte desta interação não verbal. Quando nosso tom de voz (veja que não estamos falando de imitar) se aproxima da voz do outro, isso pode gerar a identificação necessária para uma aproximação para que a relação rolfística seja mais produtiva.
Suporte e espaço também são direções para o uso da voz. Sabemos que o movimento realizado pensando em direções e também no uso do olhar (direção) tem outro nível de experiência. Agora, faca um teste: faça um longo som com a letra “a”, primeiramente sem olhar para nada e sem o contato dos pés no chão. Depois, posicione os pés firmemente no chão ganhando suporte e leve o olhar onde quer levar o som e faça o mesmo som, tentando manter o mesmo esforço utilizado na vez anterior. O corpo ganha suporte para o core e, consequentemente, os diafragmas e nosso sistema de som ganha potência e funciona com grande eficiência!
Palintonicidade
Entender que a voz pode percorrer múltiplos caminhos corporais para atingir maiores possibilidades lembra que o princípio da palintonicidade no corpo amplia a capacidade de interagir e alcançar o outro com eficiência.
“A voz é o toque a distância.” Autor desconhecido.
Holismo
Pensar na fala e na voz como elemento da construção pessoal de nossos clientes, inclusive como parte integrante da imagem corporal por eles construída pode também fazer parte do trabalho de Rolfing, é um item que pode ser integrado ao processo da relação e da percepção do cliente para que, assim como almejado por Ida Rolf, construimos seres humanos mais integrados, melhores e mais eficientes.
Abro aqui uma oportunidade de discutir a voz como uma oportunidade de trabalho indireta no Rolfing, não como os experientes profissionais da area o fazem, mas tão bem quanto relacionamos o circulo do ser através das transformações do corpo.